sábado, 15 de junho de 2013

Obrigada, revoltosos!

Obrigada, "revoltosos".
Respondo ao Jabor, "o que provoca o ódio tão violento contra a cidade?": a corrupção, o desrespeito com o dinheiro público, a segregação social, uma constituição social que não é posta em prática, a manipulação midiática. É claro que não é o ódio contra a cidade. "A cidade" aqui tem outros nomes, são as políticas de higienização, o desprezo com a educação pública, a angústia com a saúde pública, a vontade de fazer do país um quintal de poucos.
Claro que não é só por causa de um aumento de vinte centavos na tarifa do transporte público. O problema é o “público” em geral. Ou melhor, o privado. A privatização de um país onde o governo do Estado não representa a nação, o seu povo. Povo que está cansado há tempos e que ainda assim é rotulado de preguiçoso, de passivo. Povo que se faz de herói todos os dias para lutar contra uma estrutura perversa que o mastiga em diversas esferas e o rumina sem previsão para uma digestão. E é uma indigestão tão clara quanto a afirmação de que a mobilização do dia 13/06/2013 em São Paulo foi uma mobilização de "filhos de classe média", dizendo que é óbvio que "ali não havia pobres que precisassem daqueles vinténs". Mas é evidente, os pobres morrem nas favelas, nas periferias, na calada da noite, ou escancaradamente nas filas dos hospitais, das creches, das escolas públicas, da seguridade social, nas penitenciárias. E é exatamente por isso que foram arbitradas fianças, porque existe uma expectativa mínima de que os que podem pagar paguem. E assim tem sido a vida no Brasil: quem pode pagar tem educação, saúde, lazer, moradia, segurança, liberdade... ou seja, os direitos sociais são literalmente muito caros! E não é todo mundo que pode pagar.
Os policiais não são os vilões da história, concordo. Apesar de toda a violência, de toda a truculência, de toda a brutalidade, de toda acefalia das políticas de segurança pública do Estado de São Paulo (e dos demais em sua maioria) não podemos ser só irônicos e dizer que "os mais pobres eram os policiais ameaçados com coquetéis molotov". Num país em que o Estado institucionaliza um salário mínimo que chega a ser 500 vezes inferior ao salário máximo INSTITUCIONALIZADO, sem falar dos rendimentos/empreendimentos "particulares", muitas vezes subsidiados com dinheiro público, licitações fraudulentas, etc, ainda assim a ironia com a ficha salarial dos policiais não pode justificar tamanha violência. Violência contra os princípios de um suposto "Estado democrático de direito" em que uma mídia socialmente irresponsável acusa movimentos sociais de viverem no "passado de uma ilusão" através de uma "caricatura violenta"; violência em dizer que esses "revoltosos não valem 20 centavos". Violência de uma mídia que pensa tudo poder dizer de qualquer jeito, manipulando informações, omitindo e inventando, distorcendo, aterrorizando. Não falo aqui de imparcialidade, porque não sou mais tão ingênua, mas não consigo restar imune ao ouvir esse tipo de declaração de um “formador de opinião pública”. Sim, é uma merda o que a polícia está fazendo, mas é uma estrutura que vai além da força policial. O terror e a violência chocam muito pelo sangue, pelo medo, pela dor, mas não podemos negar que os policiais também são vítimas. Arriscaria a dizer que o Jabor também é uma vítima dos micro e macro sistemas que se (re)produzem em relações de poder, desde às empresas têxteis internacionais que exploram o trabalho infantil, às redes de supermercado que mandam matar os meninos de rua do seu bairro. Temo o dia em que eles tiverem a brilhante ideia de conectar os seus dois neurônios e escravizar os meninos de rua para produzir as suas roupas de grife. Isso é uma caricatura violenta talvez quase tão real quanto as imagens que vi dos confrontos entre a polícia e os manifestantes.
Seria excelente se não precisássemos passar por isso, mas isso é também muito bom, e não tem o mínimo de sadismo nessa minha fala. É um momento delicado, mas também muito importante para o país. Apesar de ser extremamente revoltante ver as pessoas apanhando, sem poder se expressar, sendo reprimidas de maneira tão violenta, às vezes penso, “queria muito estar aí”, “ir para as ruas”, “manifestar juntos”, mas por outro lado penso, "e se me matassem", "se eu ficasse cega", "se a polícia me batesse"... Não sei o que fazer. Queria conhecer pessoas "grandes", ter "dinheiro", ter "poder" para poder agir segundo a minha vontade e “resolver” isso de uma maneira menos dolorosa, mas seria mais uma tirania, apesar de toda a boa vontade que eu imagino ter. Seria mais um processo ilegítimo. O que está acontecendo hoje no Brasil faz parte de um processo pelo qual precisamos passar. Apesar de acreditar que os policiais são despreparados, que eles estão usando muito mal a força, que eles estão armados e que apesar de terem sido constituídos policiais para servir e zelar pela segurança da população, entendo que eles podem ser perfeitamente perigosos para a população, mesmo não estando juridicamente autorizados para sê-lo. Não consigo me desapegar da ideia de querer estimular a todos a participar das manifestações, de ir às ruas, de se mobilizar, mas também não consigo parar de pensar nos riscos iminentes/explícitos de violência. Por mais que eu queira, tem algo na balança que me pede para também dizer "por favor, se proteja"... e eu tenho a consciência de que esse é um medo legítimo, grande, real e também de que a causa é nobre e precisa que sejamos muitos e que estejamos unidos. Sim, eu queria ser um super-herói, levar tiros e não morrer, poder me desviar das balas com uma velocidade supra-humana, suportar violências insuportáveis, mas também penso muito na "integridade" dessas pessoas "agredidas" e me preocupo quando penso que muita gente boa pode morrer e sofrer diversos tipos de violência, dentre os quais amigos e conhecidos. Não quero ver fotos de seus rostos desfigurados correndo pelas redes sociais. Por mais que seja grandioso pensar em tudo isso, que estejamos morrendo e sendo violentados todos os dias, que estamos longe de ter a nossa integridade respeitada pelo Estado brasileiro, confesso que prefiro ver vocês ilesos e sei que isso não se confunde com apatia política. Sei do potencial e consciência política de todos, sei que muitos estão indo e irão às ruas. A esses, peço que tentem se proteger ao máximo com roupas grossas contra as eventuais balas de borracha, lenços para as balas de efeito moral, o criminalizado vinagre para amenizar o efeito do gás lacrimogênio, água mineral para lavar e hidratar os olhos e paz, muita paz. A "manifestação" está sendo feita em vários outros níveis, principalmente no dia a dia, com um olhar mais sensível a coisas que temos banalizado ou desacreditado. Espero que isso seja um despertar para um Brasil melhor, espero que tenhamos o mínimo de pessoas feridas e o máximo de pessoas sensibilizadas... estou com um aperto indescritível no coração e na mente, já discuti tanto isso em outras oportunidades, em eventos, trabalhos, textos, provas, mesas de bar, passeatas, etc... mas o que me acomete hoje é um misto de impotência com esperança indescritível, uma vontade de GRITAR para ver se alguém me escuta!!!!! Sinto uma angústia muito forte ao pensar que ainda precisamos cruzar tantas fronteiras para pensar um país menos tirano. O coquetel molotov sou eu: amor, ódio, esperança, revolta, impotência, vontade de mudança. Acredito contudo que isso tudo que está acontecendo no Brasil vai ser um despertar consciente. Vamos juntos!

terça-feira, 4 de junho de 2013

Sedutor

Eu daqui te mirando com meus olhos de garça,
Você vê e disfarça,
Se faz de sem graça
E sorri como quem entendeu tudo
Olha para baixo por um tempo quase nulo,
E se volta para fisgar os movimentos involuntários em meu rosto,
A boca contrai, a pupila dilata.
Não sei bem dissimular
Arrumo o cabelo,
Passo a mão na testa,
Tiro um cílio inexistente do canto do olho buscando voltar,
Mas me perco em seu sorriso,
Que já tão perto de mim me traz mais confusão
Não é só você que se aproxima,
Uma energia incontinente me arrasta para os seus lábios,
Não vejo mais nada,
Todos os sons se misturam em um ruído não identificado
E você se encosta ainda mais e toca meu rosto com uma ternura desnecessária
Para quem quer apenas falar ao ouvido e evitar os barulhos do bar
E procura a sua voz mais doce para nem falar tão alto,
Eu não entender faz parte do jogo.
Se aproxima ainda mais
E seus lábios me tocam
As pessoas até pensariam que era para ser sem querer,
Mas sua mão possuindo o meu rosto de um lado
Conta mais segredos que a sua boca do outro
Em vão eu resisto,
Sua outra mão me toma pela cintura,
Já não consigo contar quantas mãos você tem,
Cada uma delas cheias de tanta vida, quentes,
Deslizando em meu corpo o lendo em braile,
Os poros respondem,
Sinto-me enfeitiçada,
Meus olhos se fecham, me inclino,
Sinto um calafrio na espinha,
Prendo o suspiro,
As pernas vacilam,
Abro os olhos e inspiro mais forte do que previa
Expiro pela boca e o coração acelera
Sou minha auto-refém
E quando você percebe que venceu todas as minhas defesas eu ouço:
- O bar está cheio hoje, não é?
Como por engano, antes de se despedir do meu rosto, a sua mão ainda toca os meus lábios entreabertos
E você sorri perverso como quem diz: - Está vendo como você ainda me quer?
E no fim das contas mesmo sem ter dito nada,
Meu corpo foi um tagarela traidor.