segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

De última hora, habitantes na garagem...

Ressignificar contextos estruturais é tarefa de sísifo,
Signos, significantes e significados reformulados em descodificação,
Dialogir-se em outros em "cuidar de si",
Cuidamos de nós.
O que fica é a gratidão, a ternura, a risada, o aconchego e o desejo de que nos reencontremos em breve com tantas outras histórias para contar.
As despedidas são mesmo de apertar os corações dos passantes, mas não é assim que vejo... um até breve em fermata é o que sinto. Cabem colcheias, semicolcheias, fusas... no tempo que dermos.
É bom encontrar nos caminhos pensantes-sensíveis-sonhadores, nesse pedacinho de travessia vocês me foram luz, me foram chão, me foram mãos, me foram garagem, metáfora da qual me sirvo para dizer que habitar aqueles metros quadrados em situação de entrega e desapego é apenas um retrato da nossa cumplicidade em compartir sonhos, sentidos, desejos de mudança e emoções.
Sinto-me grata e feliz em reconhecer um pouco de mim em cada um de vocês, em poder termos aprendido juntos, não só academicamente, mas na vida. Sinto-me honrada em poder ter trabalhado com vocês, profissionais preocupados com a qualidade de um "produto" que é muito mais "processo" do que "resultado". Sinto-me incomodada em perceber que ainda temos muito a galgar em termos de reconhecimento, paz de espírito e satisfação. Mas ao mesmo tempo sei que na minha inquietude e insatisfação moram os anseios mais revolucionários de humanização e autonomia do outro e de nós mesmos.
Sinto ainda que não somos senhores da nossa pedagogia, e, com todas as implicações e contingentes que a provocam e resultam da mesma, respectivamente, sinto também que não nos fazemos vassalos das nossas limitações, tampouco suserano das nossas potencialidades. Somos apenas cronópios (para que não conhece, indico a leitura de Cortázar) idealistas, sensíveis, ingênuos, e, por isso mesmo, capazes de mudar o mundo. Obrigada por dividirem comigo este sonho. Até breve!

quarta-feira, 2 de setembro de 2015

Das loucuras

As loucuras que às vezes me visitam,
Conversam comigo, choram, gritam,
Depois vão embora e me deixam só.
Não sem traumas, mas também sem cobranças,
Liberdade que gosto de ter.

É por isso que deixo que venham,
Porque elas vão e voltam,
Sem que eu as convide,
Sem que se despeçam,
Sem que me limitem,
Sem que me subesmitem.

Uma delas é cega e a outra é surda,
Irmãs que andam juntas não só por complementaridade,
Se amam,
Mas também brigam
Muito

É bonito quando elas se preocupam comigo,
Se estou triste e choro
Uma delas me põe lápis e papel na mão e pede que eu escreva,
Ou me traz os estojos de tinta e as telas.
É surda essa minha loucura

A outra se irrita, não pode ver, não pode ler...
É mais agitada...
Pede que eu toque, que eu cante, que eu dance com ela,
Então ela me toma pelas mãos e me embala,
Já viramos muitas noites juntas.

Ah, como eu amo as minhas loucuras,
Cada uma em suas limitações,
Me dão tato,
Me constroem chão.





Comptine d'un autre été

Por muitas vezes já vivi essa sensação de estar presa em uma música,
Mas essa me acompanha de maneira singular:
Comptine d'un autre été de Yann Tiersen, é lá que me encontro há mais de um ano.

Já conhecia a canção antes de me aprisionar e não sei exatamente o que mudou desde que me descobri ali
Não sei a causa, se por vontade ou distração, mas gosto de ter esse refúgio onde minha alma se abandona,
A queda é livre, constante e infinita,

Sentir o vento me faz compreender as dimensões do meu corpo
Tocar seus ares com a ponta dos dedos enquanto caio...
... brincar de revirar... rajadas no rosto, golfadas na nuca...

Pausas despretenciosas, mortais,
Fusas, semi-fusas, colcheias, fermatas,
A itensidade percussiva nas teclas,
a alternância de graves e  agudos...

Emudeço,
Preciso parar, fechar os olhos,
Respirar...
Ar... é tudo ar em volta de mim

A predominância de agudos se impõe,
O chão está próximo,
A aceleração rompe a constância
Todos os hertz a me aletar do tombo

Mas os graves vêm em minha defesa,
Lançam teias sob o meu corpo que se quebram enquanto caio
E me amortecem, me acolhem, me abraçam,
Por um instante flutuo e a queda se anuncia pouso

A mão esquerda prepara o final do mergulho,
A direita aponta o caminho,
A respiração se reorganiza,
Inter-calada.

O eu que pulsa

Trago o tempo com ervas finas,
De dentro da boca saem tufões,
Redemoinhos longos de fumaça em dispersão

Assopro
[fuhhhhh...]

Respiro
Lenta

Olhos fechados, sentidos apurados,
O coração que pulsa,
Os músculos do meu rosto,
Meu suor,
O som da minha respiração,
Os fragmentos que me compõem.

Os músculos do meu suor,
O som do meu rosto,
Os fragmentos do meu coração,
O eu que pulsa.

Sinto-me transitória ao compreender-me viva
E o inverso também me identifica

Eis-me parte transmutada em todo,
onda na rebentação.


En passant

Às vezes a gente perde o prazo, 
às vezes a gente perde a cabeça. 
às vezes a gente não sabe perder. 
às vezes a gente não sabe...

Não sabe o que fazer com o não saber. 

Nesses momentos de insapiência é bom descobrir mestres, 
é bom descobrir amigos, 
é bom descobrir-se, 
é bom descobrir o que fazer com o não saber.

Saber que o não saber pode não ser tão ruim assim. 
E (não) saber é poder

Poder
[Olhar as dúvidas para além da insegurança, 
Motivações, consequências, caminhos... 
Querer o máximo da travessia
Amar as dúvidas, resolver as dúvidas, criar as dúvidas, ignorar as dúvidas, duvidar das dúvidas. 

Ainda que não se saiba o onde,
É importante amar a ida, 
E ir leve, ir intenso, ir inteiro, 
Um ir em eterno devir de infância, 
De sonho, de descoberta, de revolução 

Encontrar um menino-homem-escoreito-viajante-desviante alegra os caminhos, 
Agita os caminhos, 
Enche os caminhos de força e coragem, 
Multiplica os escoteiros,
Transforma a "promenade"

Eis o passeio que dura cinquenta anos trópicos, solares, 
E é só o início, e se sabe sê-lo, pois se faz ser 
Feliz trajetória, feliz caminhada, feliz passeio,
Feliz, paz, ei-lo: "passant" que fica sem estagnar, 

Água de rio que se renova a cada chuva, 
Emaranhado nos meandros das curvas,
Nas vindas e idas,
Viva (,) a vida!

sábado, 1 de agosto de 2015

Dialogir-se

Se Kafka fosse nosso contemporâneo daríamos um bom livro
Um sonho dentro de um sonho
Muitas metamorfoses em mim
Me senti muitas vezes invadindo o teu mundo
De repente eu
Calada, transitei por seus espaços, os mais distantes e labirínticos
Entreguei-me

Tenho os seus olhos doces me pedindo troca e mais nada
Dei o que eu tinha
E, ainda assim, transbordamos
Escorremos de vontade

Sinto a sua pele ereta
Seu toque
Lembro-me dos seus montes
Seu cheiro
Ainda moro neles
Me perderia em você
Volto aos seus olhos
Fonte cheia esperando a sede
Estes que são rios que bebo e beijo as àguas para dividir amor e dor

Pausa
Em fermata
Seu silêncio é casa cheia
Para perdurar
Eu estou aqui
Ao seu dispor e em plena busca
Quero o teu grito mais alto, teu choro, os teus cantos... todos eles!
As quinas e as vozes

Te levei na estrada, vento!
Tateando as flores pelas curvas e ladeiras
Teus montes ficaram no caminho e eu também os trago nas mãos, nas pontas dos dedos.
Suaves
Até os passarinhos cantaram uma canção de despedida e anunciaram nossos voos.
Rotas outras, trocas loucas, poucos refrões

Nova pausa.
Sinto vontade de me demorar em nosso abraço
Nos vejo em uma casinha-saudade que fica em duas cidades
Aconchego, poucos móveis, telhas de barro, sem número
e se chama você.
É bom brincar de sonhar nossa casa
Talvez lá...
- Par... - Ímpar
Qualquer amor seja possível...
Ganhamo-nos
"e eu ainda nem sei se acordei".


quarta-feira, 29 de julho de 2015

O melhor carinho do mundo

Desengonçado entre meus dedos, seu rosto;
O cerrar das pálpebras me davam sua entrega.
Duas janelas por sobre os cílios.

Por um pequeno instante, minha...
Era minha a graça, o privilégio de te afagar,
Desenhar em sua face movimentos disformes,
Admirar seu sorriso, boba,
Sem conseguir concatenar ideias,
Nem precisar me cercar de certezas.

E aí então eu também ria
Com todas as borboletas que decidiram me visitar
                                                                  [nesse inverno,
Vieram morar em minha barriga.

Logo eu, casa,
Morada das borboletas.

Plantei em meu coração uma rosa
Que seduzia esses bichinhos voadores.
E brincavam nos jardins das casas
E brindavam o possuir de asas
E me faziam cultivar flores
E regar amores.

domingo, 26 de julho de 2015

sexta-feira, 10 de julho de 2015

Um sim em som

Depois de dois anos, escutar a sua voz em cantoria me traz lembranças tão boas. Seus tons são doces, seu som me abraça, contudo "naufraga o cais, bem perto do porto, na porta do quarto e sai tão só". Padecemos do mesmo mal, meu bem, e sinto chamar-te de amigo. Poderia te chamar de amor, pois o amo e sabes disso. Gosto do jeito que você me olha, do carinho que você me dedica, do seu toque, seu cheiro, seu falo. O nosso erotismo é belo, intenso, sutil. Lembro do beijo que te roubei, do primeiro. Sua barba mal feita arranhando o meu rosto, seu dedilhar em minha cintura, seu eregir. E a gente sorria, como criança que cai no meio da correria. Pensávamos que seria o último, mas não seria. Apesar de afirmar que nos encontramos, de lá para cá foram tantos desencontros. Entre partidas e enlaces nos cuidamos, amamos, afastamos, enciumamos, humanos. Essa simplicidade em compreender nossa tara traduzida em risadas e zomberia não é só mais um jeito de disfarçar a heresia, é amizade, é tesão, é verdade. Ainda guardo o cântaro que você me deu.

Operações catárticas

Guarde para mim um carinho só 
Que se destaque do seu medo
Onde você se esparrame sem pressa 

Deixe o meu olhar repousar em seu sorriso 
Tímido e frágil como um brinquedo 
Para que eu me perca sem volta 

A gente aconteceu por acaso e foi bom 
Sair da rotina, poesia sem rima, canção sem refrão, 
Gosto das suas oscilações e odeio a sua antecipação
Me cala, me fere, me silencia 

Queria sonhar um dia nosso espaço 
Amortecer nossas quedas em abraços 
Feito redemoinho, ventania, tufão 
Areia jogada ao vento no meio do furacão 

Mas o longe nos habita, nos impossibilita, 
Nos traga entre os quilômetros dessa estrada amarga 
Entre o sertão e o mar 

Somos pássaros sem ninho ensaiando vôo
Perdidos no tempo
Engolidos pela velodidade 
Subestimados pela aceleração 

Qualquer um diria que foi rápido demais 
Mensagens, telefonemas, crises, jornais
Literatura barata, poesia marginal 
Branco no preto, o bem e o mal 

Desejos e brincadeiras conjugaram juntos verbos intransitivos 
O amor nasceu, cresceu e morreu prematuro, 
Não transitou pela infância, 
Não escutou discos,
Nem arranhou os joelhos.

Sinto não ter sentido o calor da sua respiração, 
a doçura do seu toque, 
o frescor do seu perfume. 
Lembranças que criei enquanto te conhecia 
E sem saber te queria. 






Acordou-me do sonho

Do pequeno calo em seu lábio superior,
me lembro,
textura, temperatura, ardência...

Sabor de guardado,
o beijo molhado acompanhando o seu olhar assustado.

A tarde era fria em Minas Gerais, os arrepios, os deslizes, os não-ditos,
Vi tudo em que acredito se desfazer entre os nossos corpos e as cobertas,
Deitei-me em seu colo,
Chorei
e dormi.

Já acordada,
a luz na sacada nos lembrava que a noite chegava
E junto com ela a realidade ainda mais fria e calada.

Seu sorriso lindo e triste me encantava,
Eu não entendia, mas admirava.
Esperançava o nascimento de um amor que logo se acabaria,
O sol se pôs, a lua se foi, já era dia.
Acordou-me do sonho.
Restou-me a saudade, o desejo, a lembrança, a fantasia.

Tudo que é líquido desliza em seu corpo.

Ter-te em meus lençóis,
detalhes,
Sentir teu cheiro,
texturas,
Conversas nuas,
Águas da sedução.
Muitos grãos desenham o mar,
Oceano de devaneios,
entrenãos,
Dúvidas, conversas dúbias,
Desejos,
Sorrateiros,
Tantos medos cobertos pelo mesmo luar,
A distância impede, os lábios pedem, o beijo,
o cerrar dos olhos, a mão na nuca,
Maluca,
Diz que sou,
Mas sem desviar o olhar,
Sem me perscrutar,
Sem me desejar.
E depois desdiz,
Como quem não fez,
Como quem não quis,
Como quem não come,
Quem não tem fome
de amar.

terça-feira, 14 de abril de 2015

Ser mosaico

Estou aos cacos,
Em cores diversas,
Espalhados no chão,
Em tons de azul, verde e carmim
Foscos, brilhosos,
Uns maiores, outros nem tanto,
São todos pedaços de mim.

Seres humanos,
Dias chuvosos,
Hoje morreu o Eduardo Galeano,
Mas não a utopia.

A neblina a noite anuncia,
Fria e calada.
Os cães choram de madrugada,
E os loucos fingem não gozar do privilégio
de não ter que ter que corresponder.

O álbum de fotos que hoje me despiu,
Me acolheu e me bateu com as mesmas lembranças,
Nada que eu não goste de lembrar,
Nada que eu prefira esquecer,
Ser herói, ser humano, ser franco, ser fraco.
Ser criança,
Ser mosaico.

sábado, 3 de janeiro de 2015

O que é o querer

- Quer não é poder (pensei).
- Mas como? (Questionaram-me).
Queria poder escutar o tempo, respondi para mim mesma. Um escrito de Pessoa me disse: "A renúncia é a libertação. Não querer é poder". Bonito, porém insuficiente. Continuo querendo poder escutar o tempo e não acho que renunciar esse querer me tratá qualquer libertação. Querer é só querer, poder é ter o que se quer. Concluí incerta quanto ao querer. Saí em devaneios. Quem quer deseja, o desejo é poderoso, o desejo pode, mas não pode tudo. Quem quer procura, cria, questiona, faz, desfaz... mas nunca haverá a certeza de obter ou alcançar aquilo que se quer. Querer é poder em incertezas. Mas quem não quer não faz nada. Quem não quer não é nada. O não querer é ausência. Querer é viver.