domingo, 21 de dezembro de 2014

Morte não vento

Perdida na ilha cheia de mim
ela é toda repleta de eu
narcisismo quebrado
os cacos no chão

No céu ou no mar o que vejo é fim
a luz é toda reflexo do breu
membros atados
conjuntos de nãos

Estou em modo subjuntivo
egoísta, altruísta, anômico
sou só cansaço
nada mais me encanta
nada mais eu faço

Revivo a fase dos porquês
intensamente
a mente a memória visita
grita
a voz solta no tempo

Raiva não tenho
Fome não tenho
Medo talvez
Mas não sei se sei
O que deveras sinto

Sede não tempo
morte não vento
sussuro os movimentos
sou labirinto dentro de mim

Estradas, bandeiras, discos, códigos
Sujeitos sujeitos
Assujeitados
Morrem, matam
Sem querer, sem saber

Não sei ser um só
Não vivo
Prefiro ser muitos
Viva o corpo no mundo
O copo sem fundo
O fundo do breu

Findo, finito, delimitado
Dissimulado
o fim do fim
o recomeço
recomeça

sábado, 26 de julho de 2014

Condominiums de fleurs

A metáfora da casa era quase boa... é como construir uma casa com a finalidade de habitá-la pelo resto da vida. É preciso analisar o terreno, estabelecer as bases, levantar os muros e só no final é que se pensa nos detalhes de acabamento, nos móveis. A casa pode ser linda, mais se ela não for construída em um bom terreno, sobre bases confiáveis e se ela não tem muros resistentes, ele pode desmoronar a qualquer momento... mas... em se falando de processo, a metáfora do jardim é bem melhor. É preciso mais do que cálculos, matérias e previsões. É preciso amor, paciência e crer nas estações.

segunda-feira, 9 de junho de 2014

Letras de Lisboa


O céu de Lisboa tem um gosto brando, branco, quase calado
Sorri emoldurado nos olhos da noite
Canta Lisboa
O trem de Batalha passa daqui a oito minutos
Os gajos conversam ao lado da fonte
Fonte, pássaros, ladeiras
Três minutos
Quero ir à baixa do chiado ver os artistas de rua
Conversar com o Pessoa e as pessoas que passam
Gosto de passear pela noite de Lisboa
Seja pelo beco da ré ou pela travessa das galinheiras
Perder-me no sotaque de Lisboa, nas vielas do Rossio
Tantos olhos morenos
No fado de Lisboa,
Nas letras de Lisboa



terça-feira, 27 de maio de 2014

Sonhei que você acreditava que as coisas que eu te dizia também eram da maior importância e a gente vivia feliz sem grandes exigências.
Um velho cego joga sementes na estrada
As pessoas buzinam dos carros e gritam:
- Velho caduco, vai provocar um acidente.
Semanas depois as mesmas pessoas admiram:
- Que lindas essas flores.

A primavera dos amores perdidos.

É, parece que acabou,
Assim mesmo sem despedidas,
Sem choro, nem dor.

Encontros desmarcados,
Convites negados,
Boas desculpas para sustentar a ausência.

Que sejam todas verdadeiras,
Nenhuma delas vai me calar
Ou me deixar dizer o que já disse...

Mil vezes, de várias maneiras,
Até como não pude
Para tudo terminar assim.

Tanto te quis que de mim esqueci,
Adormeci com fome.
Meu peito nem sangra mais.

Não tenho raiva, ódio, pena, nada
Mas me resta ainda um carinho enorme
E uma dúvida imensa que ninguém responde

É engraçado essa coisa de gostar de alguém,
De demorar a perceber que se apaixonou,
De se deixar perder, de se deixar encontrar.

Parece que chegamos.
No meio da curva desenhamos um ponto final.
Os horizontes se abrem à nossa volta.

É primavera, meu bem,
Hoje chuviscou o dia todo,
Em breve florescerá de novo.


segunda-feira, 21 de abril de 2014

Afinal, o que quer Deus?


 
O que levaria um fiel a crer que um Deus de amor o quer ver sofrer ou que Este se regojiza com a sua penitência? O que levaria um Deus que tudo pode a desejar o suplício dos seus fiéis senão o auge da Sua sacre morbidez ou da nossa incompreensão? Acreditar na fé e não compreender a lógica dessa retribuição... admirar a beleza dos rituais e se sentir incomodada por esse tipo de simbolização... Gostaria de ver chegar o dia em que abolida a necessidade de prova, descobriria em que nos apegaríamos para que alguns discursos e construções nos façam sentido.

sexta-feira, 7 de março de 2014

L'hasard qui marche bien.

Uma visita,
Uma cerveja,
Um ônibus,
Um livro...

As frases sem força
Sem sentido
Perdidas
Sós

Dia gostoso
Sem rima
O sol no caminho
Pés no chão
Encontrar por acaso alguém que se ama,
Ganhar um abraço
E voltar para casa perscrutando a memória.


segunda-feira, 3 de março de 2014

Recurso interposto

Fica tudo em suspenso
Para começo de conversa confesso
Não sei muito de pontos finais

Meu pensamento último foi reticente
Não consegui concluir
E deixo em aberto

Sinto-me escrava do gerúndio
Após tentar interromper a ação várias vezes
Continuo te amando

Desde o nosso último encontro
Tomei várias decisões radicais
A maioria delas teminou em versos

Apesar da tristeza, das lágrimas, da melancolia,
Venceu-me a nostalgia
Fiquei triste, chorei, mas depois sorri
Que posso eu fazer se não vou te ter para mim?

Queria te ter aqui comigo essa noite,
Queria te ter aqui comigo todos os dias,
Queria te levar comigo para o Brasil,
Queria te escutar mais

Seus silêncios são sedutores mas me incomodam
Trazem dúvidas que não harmonizam bem com as minhas reticências
E fica tudo em suspenso...

domingo, 23 de fevereiro de 2014

Harpa não é brinquedo

Da janela do museu de intrumentos musicais em Bruxelas eu vejo um dos movimentos de um anjo paralisado no concreto. Pergunto-me que dança ele fazia. As paredes dos prédios formavam longos degraus com pouca diferença de altura entre eles. Emolduravam o meu olhar até a parede de um prédio mais alto. Cortei a cena ali. O céu ambientava o contexto de uma maneira serena que tingi com um filtro azulado para evidenciar o sol que saía tímido de trás das nuvens. Estava feliz, queria ver o espetáculo, mas havia algo de mórbido na outra cena da fotografia. O céu ensolarado e coberto de nuvens não combinava com aquelas cores frias. E não era para combinar. A dança daquele anjo congelada no concreto me trazia uma inquietude que atravessava o vidro do museu de instrumentos musicais. Tive a impressão de parar antes do refrão e não poder escutar o resto.

domingo, 16 de fevereiro de 2014

Quantas vezes vi seu nome
Me seguindo nu pela calçada
Ontem a dor, hoje a fome
Te dizendo que não tens mais nada

Seus amigos, aonde se escondem
Estão perdidos pela mesma estrada
Os mesmos gestos noutros homens

Vivendo um ciclo ou uma cilada

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Sonhar prescinde prescrição

Foi o tempo do disparo
E derramou tudo em mim
Me disse que sonhar é caro
E que o meu saldo está no fim
Que nós não tempo pra jogar eu sei
Mas deixe eu brincar

Sobrou no céu uma resposta para te dar
Não eram gráficos então nem se propôs a questionar
Me deixe sonhar, é fácil
Se quiser tentar
Guarde na gaveta as prescrições
É como voar com os pássaros
As asas são só mais um detalhe para a imaginação.

Sonhar

Antes que o tempo voe, conte, escorra
Feito o tal homem que não dormiu
E era tudo de uma vez só
Antes que o tempo morra, sonde, estore
Por entre os dedos do Brasil
Por entre as mãos dos cidadãos

Não

Eu não queria ter medo
Eu não queria ser tão só
Eu não queria tempo de sobra pra chorar
Eu só queria ter paz
Mas quem tem paz não sonha

Vejo crianças brincando nas ruas
Vejo a lama escorrendo pelas encosta das favelas
E quando chove é Deus lamentando o filho que perdeu

Eu não queria ter medo
Eu não queria ser tão só
Eu não queria tempo de sobra pra chorar
Eu só queria ter paz
Mas quem tem paz não sonha

terça-feira, 14 de janeiro de 2014

Fazendo as malas

diz aquele cuja chama ainda arde baixa
ao risco de se apagar ao mais frágil sopro
antes tarde do que nunca
chora enquanto olha as passagens

a todos aqueles a quem não pode dar adeus
e por todos os inesqueciveis momentos
sabe que lhe faltou muito tempo
mas que precisa ir para perto dos seus

não foi medo, nem falta de coragem,
aproveitou a viagem, descobriu horizontes,
honrou palavras sem fazer promessas

apaixonou-se, descobriu-se amor
decepcionou-se, tantas vezes chorou
viveu com intensidade crendo na eternidade.

domingo, 12 de janeiro de 2014

Why so insone?


A madrugada pende para um lado da mente que só quem insoneia sabe do que estou a falar.
Os olhos embaçam, as costas doem, as horas passam, e ela continua lá, inexorável companhia.
Talvez seja uma boa amiga, mas a maioria diz que não, que não fomos feitos para dormir de dia.
E continuo a sina de pensar mil vezes no mundo antes que ele complete mais uma volta em torno de si.
Sete bilhões de pessoas a respirar, umas menos, outras mais... e eu aqui acordada pensando na vida, pensando na morte, eu seus contornos, em seus desgostos, em suas alucinações.
A madrugada desperta vontades desconhecidas, desejos inusitados, pensamentos imprevisíveis.
Gosto do que ela me propõe. E mostro o que de indecente sussura ao meu ouvido, o que de bonito ela poetiza, o que de triste ela chora, o que de bobo ela ri. 
E além de não ser só minha, sei que não vai perder tão cedo essa mania de vir me visitar em horários impróprios com seus assuntos mais variados.

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Enquanto você dormia

Tens nos olhos um mistério sereno
Uma melancolia escondida em seu sorriso que vibra
São tantos afetos em um só rosto
Que não me canso de admirá-los
Cobrir-te com as minhas orações
E descobrir-te em meus desejos
Sagrada amizade profana da qual me sirvo
Com tantos prazeres e não menos privações
Ter-te em parte
É também uma arte.