sexta-feira, 18 de junho de 2010

A sina do sol


Não sei o porquê de os ventos convergirem bem aqui na minha janela. Estão muito chateados e querem intensamente chamar a atenção de algo lá fora. Gritam, sussurram, gorjeiam e voltam a gritar, esperneiam desesperadamente e não há nada que os contenha. Nem meu cansaço, nem meu sono, nem a minha solidão.

E me fazem companhia nessa noite que talvez fosse calma não fossem seus urros ensurdecedores. Dão carona às nuvens que deslizam no céu, umas, contra a própria vontade, resistem, outras parecem brincar, desmancham-se em e reconstroem-se em formas diversas. A cada tom uma outra condição e uma nova contradição amorfa.

E o vento se acalma e se enfurece, e as nuvens dançam e deslizam no céu em passos não ensaiados.

Não havia sincronia, a noite seguia permitindo encontros e desencontros, entre ventos e nuvens, e eu ia entendendo aos poucos o porquê de os ventos convergirem bem ali na minha janela.

Vejo a formação dos pares: os ventos conduzem movimentos sinuosos no bailar das suítes. As nuvens deleitam-se, são só cintura. Entrelaçados no ar se beijam. E tudo se acalma.

Sem conseguir passar despercebido, o céu chora tranqüila e incontidamente ao ver os ventos e as nuvens se acalmarem nesse encontro, e o sol chegar para viver mais um dia de sua sina: amar a lua e não poder tê-la, pois, como se a espantasse, ela sempre foge para o horizonte mais próximo.


(Ana Míria Carinhanha)

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