terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Fim de festa.

Tentamos entrar em oito no motel. Teríamos conseguido não fossem as risadas debochadas demais que nos denunciaram à atendente: não queríamos entrar; e era bom que ela percebesse isso antes de gerar qualquer período na máquina. Também não tínhamos dinheiro para pagar...

O guardador de carros pediu dez reais, falei que só tinha cinco, e de fato, era verdade. No carro da frente um amigo disse só ter pagado dois. E provavelmente muitos ali não pagaram (nada), o mais correto; estacionamos em via pública, não era horário comercial, portanto, não havia obrigação nenhuma em pagar qualquer valor que fosse. E mais: cobravam antecipado.

Entramos. Comida e bebida à vontade. Tratei de descobrir logo o nome dos “barmen”, se chamavam Marcos e Jailton. Durante esses curtos anos de existência descobri que quando sabemos o nome das pessoas isso faz uma diferença enorme em qualquer tipo de relação. Efetivamente, nossas frutas eram as melhores, não esperávamos muito na fila, as “roskas” vinham sempre geladas e adoçadas no ponto. Além disso, era agradabilíssimo ir buscar os drinques, todos atuavam sorrindo, conversando, quase que num estado de consciência alterado. Estava tudo bem, todos felizes, satisfeitos, bem vestidos, simpáticos, sorridentes...

Primeiro momento de transição: a banda começou. Com pouco tempo o ar condicionado que era eficiente já não dá conta do trabalho, as pessoas começam a suar; a maquiagem e os cabelos a se desfazer. As gravatas e os paletós vão para a mesa e em pouco tempo as sandálias de salto alto vão lhes fazer companhia.

Segundo momento de transição: os que têm algo a dever ou têm medo de que tenham algo a dever começam a ir embora ou já foram quando a gravata e as sandálias começaram a incomodar. Na medida em que o salão se esvazia os que ficam se apropriam daquele espaço que é cada vez mais deles. As danças ficam mais expansivas, as gargalhadas mais altas, as luzes brilham mais rápido, a qualidade das músicas muda drasticamente, e, definitivamente, estamos em outra festa.

Terceiro momento de transição: a solidão se anuncia. Sem que percebêssemos, os donos da festa já tinham ido embora. O pessoal da organização já estava arrumando as mesas, varrendo o chão... A banda já tinha acabado e dançávamos ao som mecânico a pelo menos umas duas horas. Olhávamo-nos como se não compreendêssemos o término da festa. A gente não viu.

Cansados, mas ainda anestesiados da dor que amanhã daria o ar da graça, sugerimos outro lugar. Mas a segunda leva de desertores precisa ir embora, a luz contínua e uniforme, a falta de música, e as pessoas exercendo tarefas burocráticas na nossa frente são suficientes para retirar alguns do estado alterado de consciência e trazê-los de volta à realidade. É, preciso ir para casa, voltar à vida normal.

Os primeiros desertores tinham razão, saímos no lixo. Não que isso seja ruim. Ainda entramos no carro gritando... O dia amanhecia enquanto tentávamos entrar em oito no motel. O olhar da moça no balcão merecia um livro. Exercia religiosamente sua função de liberar a entrada sem olhar para o cliente para não constrangê-lo. Ríamos tanto e tão alto que antes de liberar a nossa entrada perguntou para quantos queríamos o quarto. Oito! Mas antes dela imprimir qualquer coisa demos ré. Afinal, a música já havia parado, a luz do dia era contínua e uniforme, e ela exercendo uma tarefa burocrática na nossa frente foi suficiente para retirar alguns do estado alterado de consciência e trazê-los de volta à realidade. Em algum momento seria preciso ir para casa, voltar à vida normal.

Ao final, já éramos todos desertores.

Nada que um generoso banho, uma boa noite de sono e bastante água no dia seguinte não curem.

Nenhum comentário:

Postar um comentário