quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Mar revolto

Tantas loucuras, promessas de rebelião, e procurava a calmaria das águas claras. Não disse que ia te levar pra um cruzeiro. Sempre soube que as águas eram turvas e a viajem turbulenta. Falei que a fantasia do carnaval estava pronta, e você ficou em casa com medo da chuva. Porque tanto medo?

As nuvens escureceram no céu e os marinheiros olharam-me desesperados, duvidosos, com receio de que eu desistisse, mas pedi que abrissem as velas. Quem quis desceu do barco, mas quem seguiu ainda não se arrependeu.

Abandonou-me na tempestade o marinheiro a quem dedicava o maior zelo. Não quero julgar sua fidelidade. Proteja-o, Senhor, dos seus instintos, e ajuda-me com os meus, porque esses são incontinentes.

Disse-me que não queria seguir por que o balanço do mar o enjoava, mas desceu do barco e logo subiu em outra jangada. Marinheiro, marinheiro... tenha cuidado com as ondas, respeite o mar.

Nas minhas orações peço Yemanjá para cuidar de você. Dar-te o colo e o carinho que não quer receber das minhas mãos. Dorme o sono dos justos, ainda que esteja longe de sê-lo. E quem sou eu pra falar de justiça, ladrão condenado, sem perdão, sem bagagem, sem riqueza. Dos bens que trago no bolso nada é mais valioso do que eu ofereci e julgou pouco. Minhas canções de amor, minhas promessas falhas.

Sem escudo nem espada, capitão bandido é meu nome, homem rude, grosso, viril, feio, desajeitado, tosco, não diria sem sorte, apesar de às vezes apostar na onda errada. Um homem de fé, que ama o mar e chora toda vez que acorda e dá bom dia aos seus colegas de tripulação e sente falta de um marinheiro.

Não posso ancorar no cais vendo você se aventurar de proa em proa. Se, sabe que amo as ondas, sabe onde me encontrar. Será um prazer recebê-lo de volta caso queira voltar. Sem retaliações, garanto. Mas hoje sinto que não posso prometer falta de perigo ao navegar por esse mar revolto.

 
Ana Míria Carinhanha

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